Djavan lança 'D' como luz contra o obscurantismo: 'A gente precisa acreditar na felicidade'

Ao g1, cantor celebra carreira com 25º álbum, comenta 'tremor essencial' causado pela escassez de sono e diz que show no Rock in Rio vai ser 'um tiro só' de grandes sucessos com novos arranjos.

Djavan lança 'D' como luz contra o obscurantismo: 'A gente precisa acreditar na felicidade'

Depois de tanta tristeza com a pandemia e obscurantismo dos últimos anos, Djavan quer trazer luz e leveza ao mundo com "D", álbum que lança nesta quinta-feira (11).

É por isso que canta "Deixar que o vento leve / E o amor se encarregue de tudo / E que a gente volte a rir de tudo / E que a vida seja longa e tudo" em "Num Mundo de Paz".

Ou "Vamos sorrir pra não cair em cilada, quem não ri de nada, não sabe o que tem / O que fazer? Tudo é possível como um dia de sol, é jogar o anzol e esperar pra ver o que vem", em "Iluminado", faixa em que canta com os filhos e netos e encerra o álbum.

Ao longo das 12 canções, o cantor alagoano de 73 anos também versa sobre o amor, tema belamente abordado em sua longa carreira, e sobre a natureza em "Beleza Destruída", primeira gravação com Milton Nascimento.

 

"A gente estava vivendo um período de obscurantismo muito grande, e eu queria o oposto, queria vir com luz, queria vir com uma mensagem de otimismo, queria que as pessoas acreditassem no futuro, só ele pode salvar", diz Djavan ao g1.

 

O 25º álbum da carreira foi gravado de maneira até que rápida para os padrões de Djavan, que normalmente fica em estúdio de 2 a 3 anos. Muito por conta "pela gana mesmo de estar naquela pandemia parado".

O processo começou em junho do ano passado e terminou em abril, após uma temporada em São Miguel dos Milagres, no litoral de Alagoas, onde compôs a maior parte das músicas.

Djavan escreveu músicas de 'D', 25º álbum, no litoral de Alagoas em 2021 — Foto: Divulgação/Gabriela Schmidt

"Fui com a esperança de voltar para o Rio com três letras para dar o start, mas fiz oito, fiquei felizão".

Passado o tempo de calmaria, Djavan voltou com tudo. Ele encerrou a turnê do álbum "Vesúvio", em junho, quando anunciou o novo álbum e já tem mês para estrear a próxima turnê: em março e em Maceió, cidade natal.

Mas antes, ele prepara o show "de um tiro só" com os grandes sucessos para o palco Mundo no Rock in Rio, no dia 10 de setembro, e para o Coala Festival, em São Paulo.

 

"Como você sabe, tenho um número de hits grande, daria para fazer um show de três horas. Quero fazer um roteiro que soe tipo assim 'ele trabalhou', fazer novos arranjos também", diz, rindo.

 

Djavan toca no mesmo dia de Coldplay, Camila Cabello e Bastille, e não está preocupado em parecer deslocado. "Acho que vai ser uma coisa bacana, espero que seja um show inesquecível".

 

 

Na entrevista abaixo, Djavan também fala sobre como foi incompreendido ao longo da carreira e comenta "tremor essencial", distúrbio causado pela escassez do sono que já gerou rumores de Parkinson.

g1 - Fiquei surpresa quando na final da turnê do álbum "Vesúvio", você já anunciou lançamento de "D". Conta um pouco do processo desse novo disco. Ele surge nessa "calmaria forçada" da pandemia?

Djavan - Comecei a compor o disco em junho de 2021, trabalhei em composição até outubro e gravei até janeiro. Não sei como consegui fazer as coisas com mais velocidade do que os discos anteriores, eu acho que era gana mesmo de estar naquela pandemia parado, sem poder produzir.

Saí de férias para Maceió, para São Miguel dos Milagres, na verdade, para escrever letras porque, no meu processo, eu só escrevo letra depois que tudo está pronto. A voz cronologicamente na gravação é a última coisa que entra. Fui com a esperança de voltar para o Rio com três letras para dar o start, mas fiz oito, fiquei felizão.

g1 - Em “Num Mundo de Paz”, você fala “que a gente volte a rir de tudo, que a vida seja longa e tudo”. É esse tom otimista e esperançoso que o mundo precisa neste momento?

Djavan - A gente estava vivendo um período de obscurantismo muito grande, né? A pandemia então trouxe muita tristeza, muita negatividade. Eu queria o oposto, queria vir com luz, queria vir com uma mensagem de otimismo, queria que as pessoas acreditassem no futuro. Só ele pode salvar.

Ou seja, tem que investir no futuro, investir com alegria, investir com decisão, com a certeza de que nada é definitivo. A gente precisa acreditar na felicidade. E esse disco foi feito com esse objetivo de trazer uma coisa de luminosidade, de positividade.

g1 - "D" é o seu 25º álbum. O que significa para você chegar nesse marco?

Djavan - É bem simbólico, bem bonito. Faço uma reflexão sobre toda uma vida dedicada à música e tenho um orgulho de ter tido uma dedicação plena realmente. Entre erros e acertos, acho que estou no lucro, porque é uma carreira que está aí estabelecida no Brasil, no mundo.

 

Trabalhei esses anos todos trabalhando com a mesma impetuosidade, com o mesmo prazer. É esse prazer que faz com que eu consiga abranger tanta coisa positiva na minha carreira.

 

g1 - Muito se fala da complexidade nas suas letras e é uma conversa que rola assim desde o começo da sua carreira. Te irrita um pouco esse papo?

Djavan - Não me irrita, não, porque eu reconheço, hoje, muito mais do que na época que eu comecei, porque as pessoas estão dizendo isso o tempo todo. Os fãs, os músicos, os críticos diziam que eu era diferente, que toco diferente, canto diferente, escrevo diferente, arranjo diferente.

Hoje já tenho essa consciência de que o trabalho que faço tem uma marca muito pessoal, só que isso, obviamente, para se estabelecer demora e produz um sofrimento grande. Sofri muito durante a minha vida inteira tanto de rejeição, de incompreensão. Não entendiam o que eu fazia e queriam me pôr à margem por não entender o que eu fazia.

Fui muito desqualificado por não ser compreendido, mas ao contrário do que poderia acontecer, isso só me deu mais força, porque uma coisa trouxe desde pequeno é ter muita perseverança, muita certeza. A minha mãe me ensinou isso "Mire no que você acredita e vá fundo sem titubear". Ela me ensinou isso desde pequeno, sempre fui e sou assim até hoje.

Não é um comentário, não é um negacionismo, digamos assim, com relação ao que eu faço que vai me abalar, não, porque a crítica que faço internamente é tão grande que não tem crítica maior que a minha própria, entendeu?

Estou vacinado contra isso, sofri muito, porque a injustiça dói. Ela cria um estado de desânimo muito grande, mas mesmo assim lutei o tempo todo com isso, com essas adversidades e estou aqui até hoje.

g1 - Você vai tocar no palco mundo do Rock in Rio esse ano. Queria saber como que você tá preparando esse show. Podemos esperar uma surra de hits, no estilo do álbum "Djavan Ao Vivo", de 1999?

Djavan - É a tendência, porque é um tiro só, é um show curto de 1h15, 1h20 para um mundo de gente que frequenta o Rock in Rio. Quando você produz um roteiro para um show a ideia é você produzir uma empatia em palco e plateia. Você quer que as pessoas participem daquela festa, daquele evento.

E, como você sabe, tenho assim um número de hits grande, dá para fazer um show de três horas só de hits, mas vou tentar colocar uma música nova. Quero fazer um roteiro que soe tipo assim "ele trabalhou, ele teve trabalho". Vou fazer arranjos novos de algumas coisas e tudo, então vai ser um show lindo. Espero que seja um show realmente inesquecível para mim.

g1 - Você toca em um dia até que pop, mas meio misturado com Coldplay, Camila Cabello e Bastille. Como você acha que você vai se encaixar nesse line-up?

Djavan - Não conheço nenhum dos três assim pessoalmente, nunca conversei com eles. Como a gente, hoje, via internet acaba sendo ouvido e assistido o mundo inteiro, creio que a minha música e a deles têm alguma alguma conexão. Sobretudo porque a minha música é diversificada, abrange todos os gêneros, está ali na música latina, na americana, na brasileira. Então acho que tá tudo certo, vai ser uma coisa bacana.

g1 - Recentemente, você falou sobre o "tremor essencial" que você lida há alguns anos. Em que medida você acredita que é a preocupação, em que medida você acha que é sensacionalismo ficarem procurando problemas de saúde em artistas mais velhos, como você, Caetano, Milton?

Djavan - Prefiro associar a um tipo de preocupação, porque nós somos pessoas que estamos aí na vida de todos, há anos e todo mundo que gosta, pelo menos, quer continuar tendo a gente ali falando, dizendo coisas, mostrando, trazendo alguma beleza para a vida das pessoas.

Associo a uma preocupação natural e por isso também, naturalmente, procurei esclarecer quando me foi perguntado, enquanto não perguntavam nada, eu não falava nada.

O tremor essencial, o meu, pelo menos, não sei se existem outras origens, mas o meu foi decorrente de escassez de sono. Tem fases da minha vida que eu durmo mal, durmo menos. Agora, não, estou fazendo um esforço sobre-humano para dormir pelo menos 7 horas por dia. E tenho conseguido. Mas o meu foi proveniente da escassez de sono.

g1 - A coisa boa é que todos vocês estão em plena forma, fazendo shows excelentes pelo Brasil e pelo mundo. Além dos exercícios e de uma vida regrada, você sente que rola uma energia diferente do palco que melhora esses eventuais problemas de saúde?

Djavan - Acho que o palco melhora todo mundo. Quando você chega em um palco, você está diante de 5, 10, 15, 20 mil pessoas que gostam de você, que estão ali emanando uma energia positiva.

Eu, por exemplo, tenho entrado no palco, às vezes doente, pensando "Meu Deus, eu não vou conseguir fazer show hoje". Mas quando eu começo a botar a roupa, a coisa começa a se transformar, quando eu piso no palco canto a primeira música, na segunda eu já estou boníssimo, perfeito.

É como se nada tivesse tido antes. O palco tem essa mágica, que vem do povo, vem da energia positiva que as pessoas mandam para a gente.

g1 - Para terminar, Djavan, o que você precisa para ser feliz? Onde você encontra o prazer? No placo, na turnê, no estúdio, no Rio, em Maceió?

Djavan - Eu sou, de modo geral, uma pessoa feliz porque tenho uma família muito boa, tenho um casamento muito bom, filhos legais. A gente tem uma comunhão bastante profícua, bastante boa. Todo mundo se gosta, não tem aquelas confusões.

Mas o momento de maior felicidade da minha vida é quando estou no estúdio, é o momento em que estou criando, estou trazendo tudo que está armazenado no coração, na cabeça... E é um período que dura dois três anos, se eu não compuser, se eu não começar a gravar, se não entrar em estudo, eu morro, eu passo mal.

É uma coisa que tenho que fazer e esse é um momento que me deixa muito feliz, porque eu estou ali criando... Se você conseguisse assistir um dia de gravação, você ia você entender... A gente ri tanto, é tão leve, é tão prazeroso para todo mundo que faz pena quando acaba.

Quando acaba, não, porque não eu sou quem acaba, o disco que me abandona porque uma hora eu tenho que sair do estúdio. Mas eu gosto muito também do palco, é maravilhoso você estar ali tinha tanta gente que gosta de você, poder mostrar o trabalho novo, poder mostrar as músicas que todos conhecem.

 

A música me dá muita felicidade, eu não tenho dúvida de afirmar que estou na profissão certa desde sempre, canto desde pequeno. Não posso me queixar.
Fonte:https://g1.globo.com/pop-arte/musica/rock-in-rio/2022/noticia/2022/08/11/djavan-lanca-d-como-luz-contra-o-obscurantismo-a-gente-precisa-acreditar-n